Que o macarthismo em marcha não vingue
OPINIÃO | Guerra Rússia – Ucrânia
por Vasco Lourenço, 12 de março de 2022
A guerra na Ucrânia, resultado da agressão da Rússia a esse país – não entro aqui em considerações, sobre as razões e justificações que levaram a um conflito que, como todos os demais deve ser evitado, mas que é mais frequente do que às vezes se pretende fazer crer – tem dado lugar a inevitáveis reacções das várias partes envolvidas.
Em Portugal, os meios de comunicação social, nomeadamente os audiovisuais TV e Rádio, entraram numa calorosa e animada discussão sobre a guerra.
Mais do que informação, lançam para a via pública catadupas de “informação”, mais próprias de acção psicológica, seja sobre o inimigo, seja sobre as nossas tropas, do que aquilo que os cidadãos esperariam de órgãos de comunicação social. Assim se transformando, também eles, em autênticos combatentes.
Como temos visto, porque a “outra parte” se tem encarregado de o desmascarar, de um e outro lugar, isto é, de uma e outra parte, o recurso à criação e utilização de notícias falsas (hoje conhecidas por fake news) atingiu tal intensidade que torna difícil a um cidadão ficar devidamente elucidado. O que, pelo que se tem visto, pouco interessa à maioria das pessoas. Lamentavelmente, nesta como em muitas outras situações, cada um acredita no que quer acreditar. E quando a “informação ” recebida vai ao encontro disso …
Esta guerra veio encontrar o panorama da “informação” no nosso país numa situação deveras “interessante”: os ditos comentadores – que substituíram os antigos paineleiros, sem ganhos visíveis – autênticas enciclopédias, pois de tudo percebem e são especialistas, muitas vezes não passando de verdadeiros ignorantes encartados – peroram diariamente nos audiovisuais, tentando formatar a opinião de quem ainda tem pachorra para os ouvir.
E, de repente, os que falavam de vírus e pandemia, como se fossem eminentes cientistas, passaram a falar de guerra, como se fossem extraordinariamente conhecedores dessa área, quando a maioria dos mesmos sabe o que terá lido – se é que leu – pois nunca terá ouvido um tiro…
Convidados para esses meios audiovisuais, alguns militares, com experiência e conhecimento do fenómeno guerra, aceitaram o convite para participar, enquanto analistas – e não comentadores – e apareceram ao público, imbuídos do tradicional sentimento de servir, procurando dar as suas opiniões técnicas sobre o assunto. Não se aperceberam, de início, da enorme armadilha em que os enredaram: ao juntá-los com comentadores, que aparecem a defender “as suas damas”, criaram-lhes condições para serem insultados, porque não defendem o “nosso lado “, pelo contrário, defendem o lado do inimigo.
Quero afirmar publicamente que, enquanto militar, me tenho sentido orgulhoso, pela maneira como os meus camaradas se têm comportado. Considero que têm prestigiado as Forças Armadas portuguesas, na missão de esclarecimento público que vêm realizando!
É nas situações extremas, como é o caso de uma guerra, e esta não foge à regra, que se revelam os mais genuínos sentimentos, para o bem e para o mal.
Lamentavelmente, assistimos ao expressar de mesquinhos sentimentos escondidos, de que realço a onda de defesa de limitação do direito de expressão, do direito de imprensa, por parte de quem não pensa como eles, os “donos da Verdade”; e a onda de defesa de que”os militares não podem entrar no campo da análise política, pois essa é coutada dos “políticos”, por mais asneiras que tenham feito na sua actividade, enquanto tal.
Como para grandes males, grandes remédios, aqui deixo uma sugestão aos meus camaradas que sejam convidados para procederem a análises em órgãos de comunicação social (sem quaisquer proveitos, pois o fazem em regime pró bono). A propósito, não sei se o mesmo se passa com os comentadores): recusem esses convites, nomeadamente se os pretenderem misturar com comentadores.
Vieram estas considerações pessoais, a propósito de um texto que o Coronel Carlos Matos Gomes, com a qualidade a que este Capitão de Abril já nos habituou, escreveu e que aqui vos deixamos.
Com os votos de que o macarthismo em marcha não vingue, com a nossa condenação a esta guerra de agressão e aos seus diversos responsáveis, com os votos de que a guerra termine e aconteça a Paz,
Cordiais saudações
Vasco Lourenço
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