6 de Novembro, 2025

O congresso, Mahler e a Invicta

EDUCAÇÃO DE SEGUNDA OPORTUNIDADE – Congresso Internacional do Porto [3]

Por Carlos Valentim Ribeiro

Quando me sentei no meu lugar da fila M da Sala Suggia a orquestra já tratava de afinações. Faltava pouco para o início da Sinfonia nº 5 de Gustav Malher, mas ainda sobrava algum tempo. Alguns grupos de jovens repartiam-se de forma equilibrada pelos lugares ainda vazios e casais mais idosos, que aparentavam ser habitués destas andanças, despiam serenamente casacos e gabardines, como se o concerto só tivesse lugar no dia seguinte. 

Na minha cabeça continuava ativo o eco das afirmações de Joaquim Azevedo proferidas no Congresso da Educação de Segunda Oportunidade sobre a responsabilidade coletiva de fazer muito mais para que mudanças profundas na Educação do país ocorram de facto.  

“Não é preciso tomar de assalto o castelo” adiantou. Não se trataria assim de agir de forma radical ou leviana. Mas 50 anos de tentativas de instalação de um sistema de educação justo e adequado às necessidades dos jovens, das pessoas e do país, justificariam uma nova atitude. Às tantas deveriam ser os partidos políticos, na opinião do orientador do projeto Arco Maior e ex-Secretário de Estado da Educação, a inscrever nos seus programas o objetivo fundamental de uma educação inclusiva.  

“O modo de produção da exclusão na escola não pode continuar”, ou seja, o modelo escolar dominante estaria orientado para metas e para procedimentos que necessária e assumidamente excluiria uma parte dos que nele são envolvidos.

A sinfonia que marcou um novo estilo e uma viragem artística do genial compositor austríaco arrancou com Nuno Coelho a dirigir. O maestro principal e diretor artístico da Orquestra Sinfónica do Principado das Astúrias colocou a Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música em níveis de energia máximos.  

Os dois primeiros andamentos da Primeira Parte são trágicos e sofridos enquanto os dois últimos (Parte III) revelam amor e alegria.  Passou-se do fúnebre a uma atmosfera radiante. 

Quando a sinfonia terminou e o público agradeceu com uma ovação prolongada admiti que esta passagem pela Casa da Música depois do Congresso sobre Educação de Segunda Oportunidade tinha sido um complemento estimulante graças ao génio de Malher.  

A passagem das trevas à luz constituía um excelente sinal. 

Quem não faltou à chamada nesta nova incursão no Porto foi a chuva. Quando passei pelo Mira Fórum depois de sair da Estação de Campanhã já estava razoavelmente encharcado.  

Mas a cidade faz questão de só se revelar de forma plena nestas circunstâncias: os taxistas jogam à vermelhinha na paragem de autocarro, o Seringador e o Borda d´Água encontram compradores das linhas férreas interiores, o Montenegro e o Fernandes dedicam-se à venda de ferramentas, as fachadas dos edifícios reclamam cuidados urgentes que, pelo menos, camuflem o abandono estrutural, as vielas revelam segredos com hieróglifos do Alto Egito, os convites dos restaurante são poesia de rua e os cabos elétricos insistem em descer à terra recusando as altitudes regulamentares. 

O Porto precisa de uma segunda oportunidade em alguns domínios, com destaque para a gestão urbanística das zonas mais carenciadas e dramaticamente abandonadas, mas o seu caráter genuíno esse deve ser tratado como património cultural.

Fotos @ CVR – nsf

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