Sintra no centro do debate
Imigração, lixo e insegurança dominam campanha para as autárquicas

DOSSIÊ NSF AUTÁRQUICAS 2025 [6]
por Carlos Franco
As eleições autárquicas em Sintra, um dos maiores e mais complexos municípios do país, estão a ser palco de um debate intenso, onde os problemas locais se entrelaçam com as clivagens políticas nacionais. Temas como a gestão dos resíduos, a perceção de insegurança e o impacto da imigração têm dominado a campanha eleitoral, colocando o PS e o PSD frente a frente, mas com a sombra crescente do Chega a influenciar a narrativa.
O concelho, caracterizado por uma mistura única de património histórico, densos aglomerados populacionais e zonas verdes, enfrenta desafios estruturais que os eleitores esperam ver resolvidos pelo próximo presidente da Câmara.
Lixo e degradação: o problema visível
Um dos assuntos mais prementes e visíveis é a acumulação de lixo em várias zonas do concelho. Muitos cidadãos queixam-se da irregularidade da recolha e da proliferação de resíduos em vias públicas e espaços verdes. A atual presidência socialista, liderada por Basílio Horta, que não se recandidata, tem sido alvo de críticas ferozes da oposição por esta questão.
O candidato do PSD, Marco Almeida, tem apontado o que classifica de “falta de gestão eficiente” e promete um “choque de limpeza” no concelho, modernizando serviços e aumentando a fiscalização.
Insegurança e imigração: um debate inflamado
A sensação de insegurança, sobretudo em algumas freguesias mais urbanas, é outro tema central. Mais do que uma sensação é uma realidade. Apesar da contenção dos crimes graves, a pequena criminalidade, quase nunca denunciada às autoridades, é rampante. Este sentimento está frequentemente associado, no discurso público, a questões de imigração. O concelho de Sintra tem uma das populações imigrantes mais significativas do país, com comunidades de diversas origens, sofrendo nas últimas décadas uma profunda alteração demográfica. Enquanto o PS e o PSD focam a necessidade de melhor integração e apoio social, aliados a um reforço da presença policial, o discurso do Chega adota um tom mais radical.
O partido liderado por André Ventura, tem capitalizado o descontentamento em torno destas questões. A sua candidata, Rita Matias, tem centrado a campanha num combate agressivo à imigração descontrolada, que associa diretamente ao aumento da insegurança e à pressão sobre os serviços públicos, bem como à falta de civismo que tem degradado o espaço público de forma bem perceptível. Este discurso, embora polémico, encontra eco em alguns setores da população descontentes com o status quo.
A crise habitacional emerge como preocupação transversal.
Sintra tornou-se num dos concelhos da Área Metropolitana de Lisboa com preços de arrendamento e venda mais inflacionados, obrigando muitos jovens e famílias a deslocarem-se para fora do concelho.
Os transportes representam outro calcanhar de Aquiles. A dependência do automóvel particular e a insuficiência da oferta de transportes públicos condicionam a mobilidade de milhares de trabalhadores. A prometida ligação ferroviária directa à linha de Cascais e o fecho do anel ferroviário da Linha de Sintra permanecem como promessas por cumprir.
PS e PSD: a batalha pelo centro
Do lado do PS, a candidata Ana Mendes Godinho herda a máquina de poder de um partido que governa o município há anos. A sua campanha tenta projetar estabilidade e continuidade nos investimentos, prometendo melhorias na mobilidade, requalificação de espaços públicos e uma gestão mais próxima das freguesias. No entanto, tem de enfrentar o desgaste natural de quem está no poder e a insatisfação com problemas crónicos não resolvidos.
O PSD, por sua vez, aposta na mudança. Marco Almeida apresenta-se como a alternativa renovadora, prometendo uma administração mais técnica e menos política. O desafio do PSD é consolidar o voto de protesto contra o PS e convencer os eleitores de que tem uma equipa e um plano credíveis para gerir um orçamento complexo.
A incógnita Chega e o futuro de Sintra
A grande incógnita no escrutínio de domingo é a dimensão do voto no Chega.
Se o partido conseguir eleger mais vereadores e, potencialmente, influenciar a formação de maiorias, poderá forçar uma reconfiguração do poder em Sintra. Tanto PS como PSD têm rejeitado qualquer entendimento com a formação de extrema-direita, mas um resultado forte do Chega pode complicar a governação.
CDU – o outsider que conta
A CDU (coligação PCP/PEV), com Pedro Ventura, actual vereador e que permitiu ao PS governar a câmara através de um acordo pós-eleitoral, apresenta-se como a voz da alternativa verdadeiramente à esquerda.
Centra a sua campanha na defesa do serviço público de qualidade, no controlo dos preços da habitação e na crítica à gestão capitalista do território que, argumenta, beneficia interesses privados.
Às portas do dia da eleição, os sintrenses debatem-se com uma escolha clara: entre a continuidade socialista, a mudança social-democrata ou o voto de protesto no Chega. O resultado não definirá apenas quem ocupa o executivo camarário, mas servirá também de termómetro político para o país, refletindo como estes temas sensíveis – o lixo na rua, a segurança à porta de casa e o desafio da integração – estão a moldar o panorama político português.