A odisseia de ser mulher
SEM FRONTEIRAS | Dia Internacional da Mulher 2021
Uma coligação tem mais força. Mas não serve qualquer uma. Para puxar pela igualdade das mulheres na sociedade, da plena e efetiva, é preciso que outras Lívias, Louises, Inêses, Sónias se juntem a outros Mateus e Wylliams e divulguem ou escrevam poemas, que nos perturbem com o controlo machista, que nos confrontem com o medo, que nos provoquem com a liberdade, que nos esmaguem com o feminicídio, que nos revelem as casas-prisão, que nos apelem à consciência, que nos revalorizem a diferença, que nos gritem contra o silêncio e que nos recordem que afinal a luta é diária e não só de um dia. Editado CR | Sem Fronteiras
Mulheres que somos
por Inês Costa, Lívia Glória, Louise Souza, Mateus Fonseca, George Wylliam e Sónia de Sá.
Mulheres
Ai como eu gosto de mulheres
Determinadas, corajosas donas dos seus próprios saberes
Mulheres
Ai como eu admiro mulheres
Lutadoras, resistentes, sobreviventes…
Mulheres
Ai como sofremos por sermos mulheres
Desde do medo de andar, ao medo de vestir
Desde o não poder falar, ao não poder rir
Mulheres
Ai como é difícil sermos mulheres
Numa luta constante por direitos, igualdade.
Num mundo onde os homens não gostam de ouvir as verdades….
Não, nós não falamos demais e não, nós não queremos demais…. queremos o que é nosso por direito, aquilo que vocês recebem no vosso leito.
Aquilo que queremos é igualdade e respeito
Mulheres
Ai como é bom sermos mulheres
E poder dizer que o que alcançamos hoje não nos foi dado, mas sim a luta de muitas irmãs que deram a sua vida por este nosso fado.
Controlo machista
É a partir do poema de Inês Costa que, em conjunto, mulheres e homens, refletimos o papel da mulher na sociedade, a odisseia que é ser mulher num mundo dominado pelas leis patriarcais. Ser mulher é ser, em diversas circunstâncias, discriminada; ser mulher é conviver sob controlo machista, mais ou menos explícito: “Manda mensagem quando chegares a casa”, “Não vás sozinha embora”, “Dorme aqui que já está muito tarde para andares na rua”, “Tem cuidado”, “Já chegaste a casa?”. O que, à partida, parecem mensagens inofensivas, são indícios de controlo associado à pretensa obrigação do homem ‘proteger’ a sua ‘frágil’ mulher, que mais não é do que desigualdade de género.
Crescer no medo
Ora, falamos de desigualdade de género e de tudo o que lhe está subjacente: do assédio, à violência, ao sexismo. Crescemos a aprender a viver nesta triste realidade, crescemos no medo. Temos medo de que um dia algo possa acontecer, ou às nossas mães, às nossas irmãs ou às nossas amigas.
Liberdade
A luta pela igualdade começa, antes de mais, na liberdade. Na liberdade de podermos agir com independência, sem paralisia pelo medo, com força para lutar pelos direitos básicos e com coragem para educar as meninas, as raparigas e tantas outras pessoas que, de uma forma ou de outra, se sentem mulheres, a usar essa liberdade para alcançar novos lugares de fala, novos espaços na esfera pública sem necessitar de esperar uma certa bonomia do resto da sociedade. Temos, sim, de parar de educar as nossas filhas a viverem no medo, e, sim, ensinar os nossos filhos a respeitar o lugar da mulher, que é onde ela quiser.
Feminicídio
Muito tem se falado sobre o feminismo de uns anos para cá. As conversas surgem aos poucos dentro de casa, vão para as escolas e universidades e são fomentadas nas redes sociais, além de comporem diversas situações a que estamos sujeitos(as) no dia a dia. Mas, mesmo com tanta informação diante de nossos olhos, ilustradas pelas tantas notícias sobre feminicídio e o quão grave esta realidade revela ser, algumas — na verdade, muitas — pessoas ainda não entendem a relevância e seriedade do assunto.
Casa-prisão
A desigualdade de género não está apenas no mercado de trabalho ou na política e nos sistemas de ensino, está também dentro de casa. Quantas mulheres são forçadas a abdicar de seus sonhos e vontades para terem de cuidar da casa? Quantas meninas foram forçadas a casar-se antes dos 15/16 anos? Os números não são promissores, bem vemos. Pelo simples fato de serem mulheres, as suas vidas serão marcadas por dificuldades e terrores que somente elas serão capazes de entender, mas isso não significa que devemos parar por aqui, significa que precisamos mudar atitudes e perceber o real significado do termo para que seja restabelecido nas raízes sociais, acompanhando a mudança.
A mão na consciência
Portanto, quando formos “celebrar” o Dia Internacional da Mulher, que não seja com presentes, flores ou um simples “textão” de agradecimento. É necessário pensar criticamente, colocando a mão na consciência para refletir sobre nossos atos e suas consequências para as mulheres e, obviamente, colocar tais comportamentos que promovem a equidade em prática. Porque o respeito, o reconhecimento, a valorização e a igualdade devem tornar-se imperativos na vida de todos e todas.
Respeitar as diferenças
Algo que era muito recorrente a três anos atrás e está cada vez mais diminuto e idealizado é a ideia de sororidade, que se popularizou de uma forma que nos aprisiona a antigos hábitos. A igualdade de género não é apenas para nós mulheres termos os mesmos direitos que os homens, é também para aceitar que somos humanas, que podemos não amar, nem gostar de algo, podemos falar não. Por isso convidamos a repensar a sororidade com um olhar crítico de entender que somos mulheres de muitas histórias, que somos muito diferentes, somos seres humanos com diferenças de tratamento. A ideia não é aceitar todas, mas sim respeitar as diferenças.
A voz do silêncio
Quando falamos sobre igualdade, não estamos almejando sermos mais ou melhores que homens. Também não possuímos um dia internacional só nosso à toa. O assunto vai muito além de homenagear mulheres que conhecemos, mas sim dar voz àquelas que não conseguem falar ou que foram ofuscadas, silenciadas e descredibilizadas durante a história. As mulheres têm um dia especial não porque queremos que nos vejam como especiais, guerreiras ou super-heroínas. Temos um dia especial por conta de uma luta que enfrentamos diariamente pelo simples fato de sermos mulheres e estarmos inseridas em uma sociedade desigual que, muitas vezes, não reconhece lugares de privilégio.
Luta diária
Desde muito novas aprendemos regras que apenas são válidas para nós: Não usar determinada roupa para não causar certo desconforto em homens e obrigá-los a tomarem atitudes que possam nos prejudicar. Não falar alto, pois não podemos chamar muita atenção. No trabalho aprendemos que tudo bem receber um salário inferior. Em casa precisamos estar sempre atentas a cada detalhe. Aprendemos a ouvir, não responder, só sorrir. Aprendemos que as mesmas falas e atitudes vindas de homens e mulheres possuem interpretações e pesos diferentes. Aprendemos a não incomodar, a pedir desculpas, a assumir responsabilidades que poderiam ser compartilhadas. A desigualdade não só incomoda, mas também maltrata e mata milhares de mulheres diariamente pelos motivos mais banais. O dia das mulheres é um lembrete de que vivemos em uma realidade distorcida, que nossos direitos não são iguais e a luta é diária.
Louize Inês
George Whylliam Sónia de Sá
por Inês Costa, Lívia Glória, Louise Souza, Mateus Fonseca, George Wylliam alunas e alunos do Mestrado de Comunicação Estratégica, Publicidade e Relações Públicas da UBI – Universidade da Beira Interior e Sónia de Sá, professora do curso e do Mestrado.
Foto de destaque fonte @ El país
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