Livros, revistas e memórias. De Upsala a Timor-Leste
Publicar para agir
O exílio político tem destas coisas: nunca se está exilado verdadeiramente. Trata-se de um ato de resistência que implica continuidade e coerência nas ações em favor das mudanças políticas para as quais se pretende contribuir ativamente. Entre as atividades militantes, combativas e antifascistas, na Faculdade de Ciências de Lisboa, no final dos anos sessenta, e o apoio implícito ao povo timorense através da publicação em 2001 do Livro Rostos de Esperança, existe um percurso de José Manuel Valadas Revez, que nos deixou esta semana, que nos relembra a importância de toda a matéria publicada ao longo doa anos, nos campos da agit/prop, da sistematização das experiências e da reflexão sobre a própria evolução das ideias e dos comportamentos face à procura de “um mundo melhor”.
A agit/prop
Diz-nos Fernando Cardeira num testemunho recente que ” Valadas seria um dos mais activos organizadores do que viria a ser o Comité de Desertores Portugueses na Suécia (…) No seio do Comité de Desertores foi um dos responsáveis pela edição do boletim “Guerra à Guerra”. Integrado num movimento político de esquerda foi um dos responsáveis pela edição da brochura contra a guerra colonial “Manifesto dos Soldados”.
MANIFESTO DOS SOLDADOS PORTUGUESES
Quando desertares, tenta de todas as formas expropriar armas, explosivos, fardas, documentos, mapas, etc… Se tiveres um amigo revolucionário de toda a confiança entrega‑lhe o material. Se não, enterra o material, protegendo‑o bem da humidade, ou esconde‑o num sítio seguro: quando a revolução necessitar, as armas estarão lá prontas a servir. (O Grito do Povo, 1973: 3)
Revista cultural
A tradição das revistas culturais está presente na produção nacional ao longo dos diversos ciclos históricos desde o século XiX. A Spartacus, revista dos trabalhadores portugueses, sendo uma revista com foice e martelo nas suas páginas interiores e com glorificações a Staline, teve um papel que ultrapassou largamente a sua carga ideológica maoista e serviu para agregar diferentes atores culturais em torno de ideias progressistas e até colaborativas. Fernando Cardeira adianta, em relação a José Manuel Valadas Revez que ” deu continuidade em Portugal à publicação da revista Spartacus. Estas actividades são referidas no excelente livro de José Pacheco Pereira “As armas de papel”.
Rostos de um povo
O livro publicado em 2001 que conta com legendas das fotografias escritas por José Jorge Letria e prefácio de Roberto Carneiro surge aos nossos olhos pela mão deste último nos seguintes termos: “Afinando pelo mote do avatar, Rostos de Esperança é uma obra que descreve Timor Leste através dos seus símbolos maiores de humanidade: crianças e jovens que são a promessa corpórea do Novo Timor; crianças e jovens que são a alavanca da sua história do futuro. Uma Nação, um Povo, um Projecto. Nação mártir, Povo violentado, Projecto sofrido. Ainda assim, uma Nação que ressurge na inocência dos seus rostos juvenis, que perdoa na generosidade da sua Fé, que vive uma esperança embalada na memória dos seus heróis imolados. Em Rostos de Esperança está contido todo o mistério de uma Nação.” Roberto Carneiro.
© José Manuel Valadas Revez
Fernando Cardeira, para finalizar, recorda que José Manuel Valadas Revez, que esteve sempre ligado ao mundo da edição (no passado militante e na vertente profissional no Ministério da Educação) teve um percurso de vida e de “luta que passou por muitas e variadas actividades, desde a participação na vida de organizações políticas partidárias até à dinamização de grupos culturais, de que é exemplo o ainda hoje existente “Atrium”.
Fontes: Centro Documentação 25 de Abril da UC, Gradiva, Fernando Cardeira e Arquivo AEP61/74 – Associação de Exilados Políticos Portugueses.