O futuro muda-se agora
Mariana Teles, 18 anos, na apresentação do livro Por Dentro do Chega, em Matosinhos
BIBLIOTECA DAS IDEIAS – Agir para um novo ciclo de esperança – Como combater a extrema-direita? [1]
Introdução de Miguel Carvalho, in Facebook
[publicação autorizada pelo jornalista autor do livro Por Dentro do Chega]
Deixo aqui o texto da autoria da Mariana Teles, de 18 anos, estudante do primeiro ano de Direito na Universidade do Porto, que adora Política e já viajou duas vezes para Timor-Leste como voluntária.
Convidei-a para a apresentação do meu livro em Matosinhos, no dia 5 de Outubro. Leiam-na. É um feixe de luz para o futuro, sim, mas é sobretudo presente. Aqui e agora. Sem esmorecer.
Mariana Teles, um feixe de luz para o futuro
“Desde já, tenho de realçar o empenho e o trabalho do Miguel, e expressar um agradecimento enorme e sincero por me ter dado espaço para falar.
Nesta introdução, vou reflectir sobre o poder deste partido junto dos jovens. O CHEGA cresce a partir da desinformação; propaga a ideia de que os jornalistas — verdadeiras fontes de conhecimento — tudo fazem para prejudicar o partido. Com os chamados memes, vídeos curtos e discursos inflamados, simplifica o que é complexo, recorrendo a uma linguagem emocional. Oferece respostas rápidas para problemas profundos. Cria uma comunidade que parece acolhedora, mas que é baseada na exclusão do outro. Promove a ideia de “nós contra eles”, onde qualquer diferença é vista como um inimigo, e não como parte da riqueza de uma sociedade plural.
Sei que muitos de vós se sentem desapontados com a minha geração. Por parecermos indiferentes, fracos. Passámos parte da nossa adolescência num clima de incerteza e crise político-social (crescemos a ouvir e a saber que não vamos ter reforma, que não vamos conseguir comprar uma casa e, muitas vezes, que a única opção que temos é emigrar).
Esta instabilidade origina dois grupos distintos: aqueles que, mais do que nunca, sentem a necessidade de lutar e aqueles que se sentem tão enraivecidos que encontram esperança em movimentos de aversão.
Há cerca de três, quatro anos, discutia entre amigos o discurso, rico em falácias, de André Ventura. Tudo o que dizia deixava-nos incrédulos. Agora, esses mesmos jovens — com quem, por força de princípios, deixei de conviver — gritam o nome dele nas redes sociais. É difícil mantermos a imparcialidade perante amigos com ideologias tão extremas das nossas, pois a política está em tudo. Por isso, por impulso humano, acabamos por nos afastar e, inconscientemente, criamos um fosso ainda maior de polarização e solidão. É inerente à condição humana o desejo de fazer parte de algo maior — e o partido sabe explorar este facto de forma singular.
A extrema-direita tem esta particularidade: não cresce apenas pelo ódio que propaga, mas pelo acolhimento que simula.
Este falso sentimento de pertença, numa idade tão volátil, atrai os jovens. Sentem-se seduzidos pela narrativa identitária que o partido constrói, encontrando nela uma segurança aparente. André Ventura diz aos jovens: “Nós vemos-te.” Diz: “Tu não estás sozinho.” E depois sussurra ao ouvido: “A culpa é deles” — apontando o dedo ao imigrante, à feminista, ao professor, ao artista. E os jovens, que muitas vezes não se sentem representados pelas instituições, pelos partidos tradicionais ou pelos discursos formais, encontram algo que o mundo real não tem conseguido oferecer: visibilidade, pertença e causa.
E aqui está o paradoxo: muitos dos meus colegas que hoje se deixam seduzir pelo discurso de força da extrema-direita são os mesmos que poderiam protagonizar mudanças significativas. No fundo, querem mudar o sistema — mas estão a ser instrumentalizados por aqueles que querem manter intactas as estruturas de opressão.
Por isso, é urgente criar espaços de escuta
Oferecer alternativas reais. Falar com os jovens e não apenas sobre eles. Ensiná-los a duvidar, a questionar, a confrontar o óbvio. E, sobretudo, mostrar que existe um caminho que não passa pelo ódio, pela exclusão ou pelo autoritarismo. Não basta dizer que estão errados — é preciso mostrar-lhes por que estão errados.
O partido tenta reescrever a história, negar os factos, minimizar os crimes que incentiva, sem pudor. Em suma, procura reafirmar regimes totalitários. O CHEGA anda de mãos dadas com o racismo, o machismo e o preconceito. Parte do princípio de que a liberdade de expressão inclui o direito de oprimir, de incitar à discriminação, de negar a existência de quem pensa, ama ou vive de forma diferente. Mas isso não é liberdade — é a negação total dos direitos fundamentais consagrados na nossa Constituição. Julgam que as únicas pessoas válidas são aquelas que pensam e se parecem com eles. Contudo, só caminhando nos passos de um estranho conseguimos conhecer novas realidades.
Não posso deixar de reconhecer que a perda de espírito crítico, acompanhada pela diminuição da curiosidade e do conhecimento, caracteriza por vezes a minha geração.
Não, não nos estou a chamar de ignorantes. Mas devo admitir que alguns jovens não têm as ferramentas necessárias para ler nas entrelinhas das afirmações deste partido — o que contribui para o aumento da sua popularidade.
Nas eleições passadas, tive colegas que votaram no CHEGA. Perguntava-lhes várias vezes como é que se reviam nas propostas apresentadas, no programa eleitoral. Infelizmente, a maioria nunca o tinha lido. Limitavam-se a seguir os TikToks virais ou os discursos populistas de André Ventura — cuidadosamente pensados e repensados para atrair as massas e captar a atenção dos mais descontentes.
O Tik Tok
Desesperava-me ver como um simples post nas redes sociais tinha mais peso do que pessoas corajosas e instruídas como o Miguel, que lutam todos os dias pela democracia no seu estado mais puro. A velocidade e o formato dos conteúdos publicados por pessoas como Rita Matias favorecem a superficialidade das discussões — e até a propagação da desinformação. A criação de narrativas simplificadas ou distorcidas pode confundir o público, dificultando o desenvolvimento do pensamento crítico. Ao utilizar o TikTok, o partido adapta eficazmente as suas mensagens ao formato que milhões de jovens consomem diariamente.
O que está em jogo neste momento não é apenas a política. É o futuro. Encontro — e quero dar-vos — esperança na juventude que sai à rua, que defende o planeta, que se faz ouvir, que inventa novas formas de existir. Nos meus amigos, que, tal como eu, não querem contribuir para o desprezo e ambicionam conhecer mais.
Encontro esperança em cada sala de aula onde se ensina a pensar
Dando o exemplo do meu professor de História do 12.º ano — o seu desejo de ensinar e de formar alunos com consciência social movia-o, e por isso lhe estou profundamente grata. Apesar de manter sempre a sua neutralidade, conseguia levar-nos a reflectir sobre as palavras de André Ventura, recorrendo a exemplos do nosso passado (se é que os entendem).
Um episódio em especial aconteceu nas eleições passadas dos Estados Unidos. Após a confirmação dos resultados e o discurso de Kamala Harris — durante o qual chorei, sem vergonha —, chegámos à aula desolados. Pairava um medo claro, uma grande incerteza. O professor, com a sua habitual lucidez, conseguiu dar-nos palavras de incentivo e esperança. Esta é a verdadeira função de um professor: dar-nos os pilares necessários para tomarmos decisões acertadas e não cairmos em manifestos ilusórios.
Encontro esperança em cada diálogo ou debate.
Para mim, a esperança não é ingénua — é sinal de resistência.
E a resistência começa quando digo aos meus colegas que a liberdade não se vende em slogans — constrói-se no dia-a-dia, com empatia. Constrói-se em momentos como este, por pessoas como o Miguel.
É esse o mundo pelo qual vale a pena lutar para construir. Juntos.
Muito obrigado”.
MARIANA TELES
